Redes sociais

Capítulo 10

Redes sociais

pra você que tá sem tempo...

Ao longo dos últimos dez anos, o debate sobre indígenas e populações tradicionais ganhou força e espaço cada vez maiores nas redes sociais em postagens, tanto na mídia tradicional quanto em sites e nas plataformas das redes sociais. 

O levantamento e análise das redes sociais foi realizado pela Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getúlio Vargas (DAPP/FGV) a partir de dados levantados no Facebook, Instagram e YouTube, entre 2011 e 2021, além do Twitter, entre 2019 e 2021. Foram coletadas, nos períodos pesquisados nas quatro redes sociais, mais de 9,3 milhões de postagens.

De maneira geral, os resultados apontam para a grande centralidade de perfis indígenas entre os principais atores dos debates analisados, com presença coadjuvante de perfis usualmente engajados no debate ambiental, como jornalistas e organizações ativistas.

O protagonismo crescente das organizações indígenas e indigenistas se evidencia, com destaque de mulheres ativistas indígenas, a exemplo de Sônia Guajajara, Joênia Wapichana e Célia Xakriabá.

Por outro lado, há um movimento que se observa em todas as redes relacionado à ascensão do grupo político e social ligado a Jair Bolsonaro. Os debates até 2017 apresentavam um tom mais ameno, com poucos contrapontos ligados à agenda antiambiental e anti-indígena. A partir de 2018, essa agenda ganha força e os atores ligados ao bolsonarismo se tornam a principal fonte de contranarrativas. 

A imprensa foi um dos principais meios para a promoção e para o aumento da repercussão de pautas ligadas a indígenas e populações tradicionais. Ainda que o pano de fundo da política nacional e a visibilidade que determinados atores e enfoques tenham tomado no debate público possam, numa primeira análise, parecer desvantajoso para as causas ambientais e indígenas, é importante salientar que a mobilização nas redes foi predominantemente assumida por perfis comprometidos e engajados com os temas e com alinhamento ideológico marcadamente à esquerda.

O Facebook se destaca como a rede em que as organizações ambientais, indígenas e indigenistas e mídia alternativa, como Apib, Greenpeace, Instituto Socioambiental (ISA), Mídia Índia, Quebrando o Tabu, obtiveram a maior influência no debate, com maior engajamento, sobrepondo-se a perfis individuais de ativistas e até mesmo a figuras da política institucional. 

Entre os perfis indígenas com maior destaque entre 2019 e 2021, encontram-se a influenciadora Tikuna We'e'ena; as lideranças Sônia Guajajara e Joênia Wapichana; e a youtuber indígena que acompanhou Bolsonaro na Assembleia da ONU em 2019, Ysani Kalapalo.

Nesse período, ocorreu a entrada de perfis de políticos como Jair Bolsonaro e André Janones no debate com menções a indígenas. Diferente do tom bélico adotado no período em que era deputado, as publicações de Bolsonaro exaltam a cultura indígena e reforçam a necessidade de respeitar a “liberdade” dos povos, acusando ONGs de tentarem mantê-los presos a uma condição fixa. É interessante, no entanto, observar também a atuação de grupos que adentram a disputa política com viés ideológico à esquerda, a exemplo da Mídia Ninja. 

O Instagram, por sua vez, foi a rede em que predominaram as publicações feitas por celebridades. De atuação menos constante no debate, elas são importantes para expandir o alcance de campanhas para públicos que não estão tão ativamente engajados nas discussões. A questão indígena obteve especial atenção em campanhas que se articularam em diálogo com a conservação ambiental. 

Até 2016, destacam-se celebridades do mundo artístico, como Bruno Gagliasso, Gisele Bündchen, Luciano Huck, Fernanda Lima, Camila Pitanga, entre outros. Depois disso, perfis de políticos como Guilherme Boulos, Jean Wyllys, Marcelo Freixo e Marina Silva passam a ter maior inserção, assim como nota-se a presença mais expressiva de contas pessoais de representantes e lideranças indígenas na plataforma, mais uma vez, especificamente, de mulheres ativistas indígenas relevantes no campo institucional e nos ambientes digitais: Sônia Guajajara, Joênia Wapichana e Célia Xakriabá. Observa-se ainda a forte presença de atores relevantes, como a Apib, o ISA, a Mídia Ninja e o Quebrando o Tabu.

O Twitter é o espaço composto por uma maior variedade de atores e com maior relevância em relação ao público formador de opinião, com a presença de organizações, jornalistas, acadêmicos e figuras da política institucional – é onde o debate acontece. Entre 1º de março de 2019 e 31 de maio de 2021, foram identificadas 7,6 milhões de menções a povos indígenas no Twitter.

É importante destacar a formação de um conjunto de lideranças nessa rede, com a presença crescente de jovens, como Alice Pataxó, que estava em décimo lugar em alcance potencial em 2019, passando para segundo, em 2020, e primeiro lugar, em 2021.

Perfis como @alice_pataxo, @GuajajaraSônia, @JoeniaWapichana e @PataxoThyara, os cinco primeiros em alcance de 2021, se articulam em questões políticas, campanhas e também mobilizam temas ligados às culturas tradicionais.

Em dois momentos, a pauta ganhou forte repercussão na plataforma. Em agosto de 2019, ponto culminante do debate sobre indígenas, postagens criticam o presidente Jair Bolsonaro e o apresentam como um líder político que ataca os povos e os territórios indígenas. Em setembro de 2020, perfis de indígenas denunciam desmatamento na Amazônia, garimpo ilegal e incêndio no Pantanal.

O YouTube foi a rede que menos apresentou resultados, com a presença esporádica de vídeos sobre indígenas e populações tradicionais de grande repercussão. A rede foi marcada por picos específicos que não sugerem a formação de uma rede audiovisual de grande estrutura e alcance. Entre os destaques, estão as entrevistas das personalidades indígenas Ailton Krenak ao programa de televisão Roda Viva e a procura por conteúdo educacional sobre o tema, como os do canal Educalu.

O levantamento traz, ainda, um estudo de caso sobre o inquérito aberto a pedido da Funai contra a ativista Sônia Guajajara. Essa análise teve o objetivo de montar um quadro mais amplo de atores e coalizões que se engajam e mobilizam o debate sobre indígenas na plataforma. O resultado mostrou que a grande maioria das interações foram de ativistas e organizações se mostrando solidários à Sônia Guajajara e criticando o governo federal. Menos de 5% das interações foram promovidas por canais de mídia alternativa e blogueiros e influenciadores conservadores, grupo que condena os ataques de Sônia Guajajara contra o governo federal.

Outras redes, como LinkedIn e TikTok, não foram analisadas porque não disponibilizam uma coleta ampla de dados, o que não significa que não sejam também relevantes para o debate.

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A Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getúlio Vargas (DAPP/FGV) coordenou o levantamento de narrativas sobre pautas indígenas nas redes sociais digitais.

A partir de dados levantados no Facebook, Instagram, YouTube, entre 2011 e 2021, e no Twitter, entre 2019 e 2021, foram apontados os fluxos narrativos considerando eventos, atores chaves e conteúdo de imprensa publicados nas redes, a fim de descortinar sua evolução no ecossistema digital.

Nessa perspectiva, a partir de regras linguísticas que levam em consideração as especificidades de cada rede social mapeada, foi possível coletar mais de 9,3 milhões de postagens sobre esse debate.

Buscou-se identificar a evolução dos principais temas, menções, atores, campanhas e eventos relacionados ao assunto nesse período, o que permitiu detectar e analisar eventos e protagonistas de maior impacto nos ambientes digitais ao longo do período da pesquisa.

O levantamento traz, ainda, um estudo de caso sobre o inquérito aberto a pedido da Funai contra a ativista Sônia Guajajara. Essa análise teve o objetivo de montar um quadro mais amplo dos atores e das coalizões que se engajam e mobilizam o debate sobre indígenas na plataforma.

De maneira geral, os resultados apontam para a grande centralidade de perfis indígenas entre os principais atores dos debates analisados, com presença coadjuvante de perfis usualmente engajados no debate ambiental, como jornalistas e organizações ativistas.

Abaixo, os principais resultados por rede social.

Facebook

Entre 1º de agosto de 2011 a 31 de maio de 2021, foram identificadas 1,5 milhão de menções a povos indígenas em publicações do Facebook, gerando mais de 287,5 milhões de interações.

Evolução de posts e engajamento no debate sobre povos indígenas no Facebook

Período: 1° de agosto de 2011 a 31 de maio de 2021

Fonte: Facebook | Elaboração: DAPP/FGV

Entre 2011 e 2014, o debate não atingiu alto volume de menções, com picos mais evidentes a partir do último ano. Um dos destaques do período foi a luta de indígenas Munduruku junto ao Greenpeace contra a construção do Complexo Hidrelétrico do Tapajós. 

Entre 2015 e 2018, destaca-se a intensificação em torno do povo Guarani-Kaiowá, especialmente em torno da hashtag de mobilização #SomosTodosGuaraniKaiowá. Em todo o período, foram coletados mais de 17 mil posts, que somaram mais de 1,5 milhão de interações. O tema obteve maior destaque no segundo semestre de 2015, com a presença de publicações do então deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ), da atriz Bruna Lombardi e de organizações como Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Greenpeace, Mídia Ninja, Anistia Internacional e Coletivo Mariachi.  

Entre 2016 e 2018, o debate se apresentou de modo bastante fragmentado, com posts que refletiram sobre a cultura indígena, ações do Greenpeace junto aos indígenas Munduruku, denúncias contra declarações de cunho racista do então candidato à presidência Jair Bolsonaro e notícias oficiais sobre a presença do Estado no atendimento médico a populações indígenas. Por fim, entre 2019 e 2021, destaca-se a entrada de perfis de políticos como Jair Bolsonaro e André Janones no debate com menções a indígenas. Diferente do tom bélico adotado no período em que era deputado federal, as publicações de Bolsonaro exaltam a cultura indígena e reforçam a necessidade de respeitar a liberdade dos povos, acusando ONGs de tentarem mantê-los presos a uma condição fixa.

Entre os perfis indígenas com maior destaque no período, encontram-se a influenciadora Tikuna We'e'ena; as lideranças Sônia Bone Guajajara e Joênia Wapichana; e a youtuber indígena que acompanhou Bolsonaro na Assembleia da ONU em 2019, Ysani Kalapalo.

Páginas e grupos com mais engajamento e postagens no debate sobre indígenas no Facebook

Período: 1° de agosto de 2011 a 31 de maio de 2021

Fonte: Facebook | Elaboração: DAPP/FGV

Dentre os principais perfis, páginas e grupos públicos com o maior volume de publicações no Facebook, é notória a presença de organizações indígenas e indigenistas, o que indica um esforço sistemático desses atores de pautar e de ser porta-vozes do debate digital sobre os povos indígenas. É observada também a atuação de grupos que entram na disputa política com viés partidário e ideológico à esquerda, a exemplo dos perfis A Gazeta Petista, Mídia Ninja e Pérolas dos Coxinhas #ForaBolsonaro.

No que se refere ao acúmulo de engajamento ao longo dos anos analisados, destacam-se canais de mídia alternativa com viés editorial à esquerda (Quebrando o Tabu e Carta Capital), canais da imprensa tradicional (G1 e UOL), organizações ambientais (Greenpeace e Instituto Socioambiental) e atores da política institucional (Jair Bolsonaro e Marina Silva). Afora o presidente Jair Bolsonaro, segundo ator com maior número de interações sobre o tema, de maneira geral, são perfis que defendem e frequentemente se envolvem em campanhas de mobilização favorável à causa indígena. 

Embora haja intensa atuação de perfis indígenas e indigenistas, não se observa uma capacidade equivalente de engajamento nessas páginas e grupos públicos no Facebook quanto a de outros atores que se apropriam da pauta indígena, principalmente vinculados à mídia (alternativa e tradicional), à política e às ONGs, que são mais preponderantes em mobilização e alcance.

Páginas com maior engajamento no debate sobre indígenas no Facebook por ano

Período: 1° de agosto de 2011 a 31 de maio de 2021

Fonte: Facebook | Elaboração: DAPP/FGV

Páginas com mais publicações no debate sobre indígenas no Facebook por ano

Período: 1° de agosto de 2011 a 31 de maio de 2021

Fonte: Facebook | Elaboração: DAPP/FGV

Diferentemente da análise sobre o número de interações, quando é observado o número de posts, há maior presença de organizações ligadas à causa indígena mais diretamente, como Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Unidas contra o Genocídio Indígena, Apoio os Direitos dos Povos Originários do Brasil, Indígenas em ação, entre outras. Ainda comparando os dois gráficos, somente quatro páginas estiveram presentes entre as que mais publicaram e engajaram em relação à temática indígena: Brasil de Fato, Uma Gota no Oceano, Instituto Socioambiental (ISA) e Mídia Ninja. 

O número de postagens reflete com mais nitidez a atuação contínua de grupos e perfis que se mobilizam e tomam parte na luta dos povos indígenas. Nos primeiros anos, já é possível observar o teor e as ações políticas que caracterizam os participantes em destaque, com a movimentação contrária à construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte sendo o assunto em evidência. 

Em todo o período, fica demonstrada a atuação digital preponderante e progressiva das organizações indígenas e indigenistas com destaque para o Instituto Socioambiental (ISA), a Apib e, mais recentemente, a Mídia Índia. Além disso, despontando como o principal perfil de 2021, e reconhecidamente uma das principais lideranças indígenas de grande visibilidade nas redes sociais, Sônia Guajajara figura como o único perfil de um representante indígena de destaque nesse conjunto de dados, sendo uma das principais disseminadoras e, por conseguinte, uma das principais vozes na amplificação das denúncias e lutas indígenas.

Entre as páginas e os grupos que fazem oposição à causa indígena, destacam-se Grupo Olavo de Carvalho e Bolsonaro 2022, que em 2019 ocuparam a segunda e a quarta colocação entre as que mais publicaram. Entre as publicações de destaque, estão críticas ao financiamento de ONGs ligadas à causa indígena e denúncias sobre a suposta elevação dos recursos gastos com a saúde de indígenas. Entre as principais narrativas, há forte presença de publicações que articulam os esforços de ONGs para proteger indígenas e supostos interesses de bilionários internacionais, como George Soros. Nesse sentido, as críticas e as ações do governo federal que buscam dificultar a preservação de terras indígenas demarcadas são elogiadas como uma demonstração de força em relação a esses interesses.

Campanhas e eventos-marco

Evolução de menções a eventos-marco sobre indígenas e populações tradicionais no Facebook

Período: 1° de agosto de 2011 a 31 de maio de 2021

Fonte: Facebook | Elaboração: DAPP/FGV

A coleta sobre eventos-marco no debate sobre indígenas e populações tradicionais no Facebook ocorreu em 525,1 mil postagens, gerando mais de 126,1 milhões de interações. Entre 2011 e 2018, observam-se poucos períodos de pico. A partir de 2015, os picos relacionados às comemorações do Dia dos Povos indígenas se tornam constantes, com publicações de artistas como a apresentadora Maísa Silva, o coletivo Mídia Ninja e a política Marina Silva. Entre os eventos com mais interações, destacam-se os protestos contra a construção de uma barragem no Rio Tapajós, em 2016 (com predominância do perfil do Greenpeace), e contra o avanço de mineração, grilagem e destruição da Amazônia durante o governo de Michel Temer, em 2017.

Entre 2018 e 2021, há um aumento de publicações de destaque feitas por membros do governo de Jair Bolsonaro, com diversas publicações que buscaram desmentir ou amenizar os impactos das queimadas na floresta amazônica. Essas publicações estiveram entre as principais no pico observado em agosto de 2019. Um discurso da ativista Alessandra Munduruku na Câmara dos Deputados, publicado pela página Quebrando o Tabu, em junho de 2019, obteve o maior número de interações nesse período. O discurso também ocorreu no contexto de aumento das queimadas na Amazônia.

Por fim, novas queimadas em biomas brasileiros, como o Pantanal e a Amazônia, motivaram novo pico de menções em setembro de 2020. Apesar da presença de diversas postagens de lideranças políticas de direita, há, entre os perfis com mais publicações, postagens que denunciaram os danos causados pelos incêndios, como as do Quebrando o Tabu, TNT Sports Brasil e Luisa Mell.

Evolução de menções a campanhas sobre indígenas e populações tradicionais no Facebook

Período: 1° de agosto de 2011 a 31 de maio de 2021

Fonte: Facebook | Elaboração: DAPP/FGV

INSTAGRAM

Entre 1º de agosto de 2011 e 31 de maio de 2021, foram identificadas 219 mil menções a povos indígenas em publicações do Instagram, gerando mais de 281,5 milhões de interações.

Evolução de posts e engajamento no debate sobre indígenas no Instagram

Período: 1° de agosto de 2011 a 31 de maio de 2021

Fonte: Instagram | Elaboração: DAPP/FGV

Entre 2011 e 2016, o Instagram apresentou volume muito baixo de publicações com menções a indígenas, concentrando-se em posts esporádicos de celebridades como Bruno Gagliasso, Giovanna Ewbank, Gisele Bündchen, entre outros. Nos anos subsequentes, há picos de menções nos meses de abril, por ocasião do Abril Indígena. Diferente de outras redes, no Instagram, a presença de celebridades entre as publicações com mais interações é predominante desde o início da intensificação do uso da plataforma. Destacam-se artistas como Alessandra Negrini, Luciano Huck, Thaila Ayala, Cauã Reymond, Letícia Spiller, Fernanda Lima, Camila Pitanga, Paolla Oliveira, Reynaldo Gianecchini, Leandra Leal, Mônica Iozzi, Babu Santana e Gaby Amarantos.

Assim como no Facebook, o debate sobre indígenas no Instagram ganha uma feição mais ligada à política institucional, com publicações de grande engajamento realizadas por páginas de políticos de direita, como o presidente Jair Bolsonaro, a deputada federal Joice Hasselmann e o deputado federal Eduardo Bolsonaro. Entre os principais discursos mobilizados por esse conjunto se destacam críticas à atuação de instituições como a Funai, vídeos com registros de uma manifestação de “indígenas ruralistas”, tentativas de associar incêndios florestais a tradições indígenas, críticas à atuação de lideranças indígenas, demonstrações de apoio ao governo por parte de indígenas e até o anúncio de uma criptomoeda indígena. Entre os perfis da política institucional de esquerda e centro-esquerda, destacam-se  Guilherme Boulos, Jean Wyllys e Marcelo Freixo, que se engajaram em publicações críticas à política voltada para a população indígena, especialmente após 2016. 

O aumento de menções em outubro de 2018 ocorre no contexto da eleição de Jair Bolsonaro para a presidência do Brasil, com manifestações de artistas como Ana Cañas e Bela Gil e de políticos como Marina Silva, que colocaram a causa indígena como um dos elementos centrais para rejeitar a possibilidade de voto no candidato do PSL. Em 2021, destacam-se as participações de indígenas em atos contra o governo e também o processo de vacinação contra a Covid-19, em publicações de páginas como Quebrando o Tabu e Mídia Ninja.

No Instagram, os perfis que se destacam em atuação e engajamento seguem padrão similar ao Facebook, sendo as organizações indígenas e indigenistas preponderantes em número de postagens, e portais de mídia, organizações ambientais e atores políticos com destaque em acúmulo de engajamento. Nota-se, contudo, a presença mais expressiva de contas pessoais de representantes e lideranças indígenas na plataforma, mais especificamente mulheres ativistas indígenas relevantes no campo institucional e nos ambientes digitais: Sônia Guajajara, Joênia Wapichana e Célia Xakriabá. Observa-se, ainda, a manutenção de atores eminentes nos temas indígenas – ISA, Apib, Mídia Ninja e Quebrando o Tabu – e a entrada de outros atores que vão crescentemente angariando visibilidade e vinculação com a temática, a exemplo da liderança Sônia Guajajara, e atores que se encontram no outro ponto do espectro ideológico, como a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos Damares Alves e o próprio presidente Jair Bolsonaro.

Páginas com maior engajamento no debate sobre indígenas no Instagram no tempo

Período: 1° de agosto de 2011 a 31 de maio de 2021

Fonte: Instagram | Elaboração: DAPP/FGV

No Instagram, as páginas com maior engajamento no debate sobre povos indígenas são compostas por mídias alternativas, figuras do meio artístico, personalidades e políticos alinhados a partidos de esquerda, representantes indígenas e atores sociais que representam o governo federal. Outro ponto que chama atenção é o crescimento no engajamento do perfil de Jair Bolsonaro – do ano de 2018-2019 para 2020-2021. Esse perfil evoca campanhas em favor do agronegócio e faz publicações se colocando como um “grande irmão” para os povos indígenas. 

Páginas com mais publicações no debate sobre Indígenas no Instagram no tempo

Período: 1° de agosto de 2011 a 31 de maio de 2021.

Fonte: Instagram | Elaboração: DAPP/FGV

O número de postagens a respeito da pauta indígena foi ganhando força ao longo dos últimos dez anos. No período 2011-2013, ainda muito tímido, o perfil com mais publicações foi o da chef de cozinha Bel Coelho, seguida por Ministério do Turismo e Instituto Socioambiental. Entre 2014 e 2015, ganhou destaque a organização Uma Gota no Oceano. Em 2016 e 2017, a atenção da plataforma se divide entre mais páginas, ampliando o número de postagens tanto do Instituto Socioambiental quanto da jornalista Luzia Lacerda e do seu projeto de feira mística Expo Religião. A partir de 2018, há um salto no volume de publicações por biênio nas páginas da plataforma; nesse período, as postagens dos canais de mídia alternativa Mídia Ninja e Mídia Índia têm protagonismo, bem como as da líder indígena Sônia Guajajara e da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil.

Evolução de menções a eventos-marco sobre indígenas e populações tradicionais no Instagram

Período: 1° de agosto de 2011 a 31 de maio de 2021

Fonte: Instagram | Elaboração: DAPP/FGV

Entre 2011 e 2017, os principais picos estão associados a postagens sobre o Dia dos Povos indígenas. Em agosto de 2017, há a intensificação das interações em publicações feitas por celebridades como Gisele Bündchen e Marina Ruy Barbosa em torno da hashtag #todospelaamazonia. Em agosto de 2019, há o segundo maior pico de menções registrado no período, em reação aos incêndios florestais na Amazônia. Nesse contexto, além da própria Gisele Bündchen, outras celebridades, como Bruna Marquezine e Ivete Sangalo também se engajam na campanha. 

O período de queimadas, em especial os registros de animais atingidos pelos incêndios, motivaram pico acentuado em setembro de 2020, com grande engajamento em publicações feitas pelas páginas Quebrando o Tabu, Alfinetadas dos Famosos e Luísa Mell.  

Evolução de menções a campanhas sobre indígenas e populações tradicionais no Instagram

Período: 1° de agosto de 2011 a 31 de maio de 2021

Fonte: Instagram | Elaboração: DAPP/FGV

A coleta sobre campanhas no debate sobre indígenas e populações tradicionais no Instagram foi feita com base em 24,2 mil postagens, que geraram mais de 33 milhões de interações.

A primeira Marcha das Mulheres Indígenas também obteve repercussão relevante no Instagram, com o quarto maior pico do período, com mais de 1,3 milhão de interações. A partir de setembro de 2021, a campanha #AmazonOrBolsonaro ganha força, reunindo mais de 460 mil interações de perfis como o do cantor Caetano Veloso e das atrizes Alice Braga e Patrícia Pillar.

YOUTUBE 

Entre agosto de 2011 e maio de 2021, foram identificados aproximadamente 8 mil vídeos a respeito de algum tema relativo a povos indígenas e populações tradicionais no YouTube. Os vídeos contabilizaram um total de 274 milhões de visualizações ‒ uma média de 34,1 mil acessos por vídeo na plataforma. 

Evolução de visualizações e vídeos sobre indígenas no YouTube

Período: 1° de agosto de 2011 a 31 de maio de 2021

Fonte: YouTube | Elaboração: DAPP/FGV

Em todo o período analisado, foram identificados 6,6 mil vídeos no YouTube sobre pautas indígenas, que alcançaram, juntos, 145,8 milhões de visualizações. 

Embora o número de postagens tenha crescido ao longo dos anos ‒ alcançando um pico com 230 vídeos em abril de 2021, o momento de mais acessos aconteceu no início do período ‒ pontualmente, em fevereiro de 2012 ‒, quando os 40 vídeos postados naquele mês foram vistos mais de 42 milhões de vezes. A marca se justifica pela forte repercussão de um vídeo, do canal de notícias Euronews, sobre as dificuldades que autoridades enfrentavam, na época, para manter turistas afastados de comunidades indígenas isoladas na Amazônia. 

Outro momento de grande atividade no YouTube sobre indígenas se deu em agosto de 2020. Foram 313,6 mil acessos aos 136 vídeos postados neste mês, dos quais se destacam as visitas do cantor Jacques Vanier e do youtuber João Quirino a aldeias indígenas, além da entrevista da líder indígena Sônia Guajajara ao canal do veículo de imprensa Carta Capital

O alto número de vídeos postados em abril de 2021 se deve a iniciativas relativas ao Dia dos Povos indígenas, celebrado no dia 19, dentre as quais se destacam a entrevista do líder indígena Ailton Krenak ao programa televisivo Roda Viva; uma videoaula sobre o Dia dos Povos indígenas, no canal Educalu; e o testemunho sobre produção comercial de arroz por comunidades indígenas de Mato Grosso, compartilhado no canal oficial do presidente Jair Bolsonaro

Os 230 vídeos publicados na plataforma, nesse mês, alcançaram um total de 2,1 milhões de visualizações.

Canais com mais visualizações e publicações sobre povos indígenas no YouTube

Período: 1° de agosto de 2011 a 31 de maio de 2021

Fonte: YouTube | Elaboração: DAPP/FGV

Principal canal a abordar a temática indígena no YouTube no período analisado, com 134 vídeos, o veículo de comunicação educativo Rede TVT se concentra em veicular episódios da esfera política brasileira que, de alguma forma, reverberam na pauta. Grande parte desse material repercute manifestações de lideranças e membros de comunidades indígenas ‒ como o cacique Raoni ‒ em que criticam o governo federal e, principalmente, o presidente Jair Bolsonaro.

Outro canal com participação de destaque na pauta é a rede de televisão pública do Executivo, TV BrasilGov, cujos vídeos incluem desde documentários sobre a vida e a cultura de tribos (sic) indígenas brasileiras até ações do governo federal em favor das comunidades ‒ como obras de infraestrutura e iniciativas para a promoção da saúde e da educação da população. 

Canais com mais visualizações sobre povos indígenas no YouTube no tempo

Período: 1° de agosto de 2011 a 31 de maio de 2021

Fonte: YouTube | Elaboração: DAPP/FGV

No final do período analisado, entre 2019 e 2021, a atenção dada aos vídeos sobre pautas indígenas se divide, rendendo engajamento mais equilibrado entre os canais. O maior número de visualizações, no entanto, acontece nas videoaulas (preparatórias para o Enem) sobre comunidades e línguas indígenas, do professor de história Eduardo Bueno, em seu canal Buenas Ideias. Além disso, as entrevistas das personalidades indígenas Ailton Krenak e Kaká Werá ao programa de televisão Roda Viva geram forte engajamento na plataforma.

Canais com mais vídeos sobre povos indígenas no YouTube no tempo

Período: 1° de agosto de 2011 a 31 de maio de 2021

Fonte: YouTube | Elaboração: DAPP/FGV

Entre 2011 e 2014, a maior parte do material audiovisual postado no YouTube com pautas indígenas era promovido, principalmente, por canais oficiais do governo, como TV BrasilGov e TV Senado, com informações a respeito de políticas públicas de interesse das comunidades; ou por canais de notícia locais (como Amazon Sat e SBT MS), com notícias de episódios pontuais, tais como confrontos e assassinatos, envolvendo membros de comunidades indígenas.

De 2019 a 2021, canais de associações e movimentos sociais ou, ainda, de oposição ao governo federal, como Mídia Ninja, Apib e Instituto Socioambiental, consolidam sua participação no YouTube. Além de saírem em defesa das causas indígenas, os vídeos criticam a atuação do governo, de maneira geral, e a sua gestão de políticas públicas que afetam as comunidades, em particular.

Páginas e grupos com mais engajamento e vídeos no debate sobre populações tradicionais no YouTube

Período: 1° de agosto de 2011 a 31 de maio de 2021

Fonte: YouTube | Elaboração: DAPP/FGV

TWITTER

Entre 1º de março de 2019 e 31 de maio de 2021, foram identificadas 7,6 milhões de menções a povos indígenas no Twitter. Em dois momentos, a pauta ganhou forte repercussão na plataforma. Em agosto de 2019, quando o debate contabilizou cerca de 626,7 mil postagens; e, em setembro de 2020, com 517,8 mil postagens.

Evolução do debate sobre indígenas no Twitter

Período: 1º de março de 2019 a 31 de maio de 2021

Fonte: Twitter | Elaboração: DAPP/FGV

Em agosto de 2019, ponto culminante do debate sobre indígenas, postagens criticam o presidente Jair Bolsonaro e o apresentam como um líder político que ataca os povos e os territórios indígenas. Além disso, uma postagem, com forte engajamento, repercute uma comparação entre os presidenciáveis de 2018 em que Jair Bolsonaro sinaliza não ser favorável a assegurar unidades de conservação nem demarcar terras indígenas. Destacam-se os perfis do influenciador digital @felipeneto e do artista @LeandroRamos.

Entre as publicações alinhadas ao governo, é possível se distinguir três principais linhas argumentativas: 1) posts que buscam retirar a responsabilidade de Jair Bolsonaro em relação à situação dos indígenas no país; 2) denúncias de crimes cometidos pelos governos do PT contra a população indígena; e 3) tentativas de fazer associações espúrias entre lideranças indígenas, ONGs e agentes internacionais.

Em junho de 2020, há um novo pico de menções motivado por pautas como a denúncia do desaparecimento de corpos de crianças Yanomami; o debate sobre a exposição pública de candidatos que supostamente fraudaram cotas para indígenas em concursos públicos; mobilizações contra a invasão de garimpeiros em terras indígenas e também relatos sobre a luta contra as queimadas em territórios protegidos por indígenas.

Em setembro de 2020, perfis de indígenas denunciam o desmatamento na Amazônia, garimpo ilegal e incêndio no Pantanal, com destaque para o perfil de @alice_pataxo, que obteve 11 mil retuítes e 23,4 mil curtidas em uma de suas postagens. Além disso, o perfil @jairbolsonaro divulga imagens e vídeos (com 333,4 mil visualizações até outubro de 2021) de indígenas que são a favor do seu governo e veicula informações que expõem as queimadas como uma forma da cultura indígena limpar a terra.

Atores com maior alcance potencial no debate sobre povos indígenas no Twitter

Período: 1º de março de 2019 a 31 de maio de 2021

2019 2020 2021
Perfil Perfil Perfil
GuajajaraSonia cristianwariu alice_pataxo
xinguvivo alice_pataxo oncapataxo
JoeniaWapichana ChirleyPankara GuajajaraSonia
ApibOficial GuajajaraSonia JoeniaWapichana
MNIndigena Dario_Kopenawa PataxoThyara
Indio_eh_nos Alkorap1 Alkorap1
Naine_Terena AvelinBuniaca DMunduruku
RadioYande JoeniaWapichana ApibOficial
midia_india DMunduruku elianepotiguara
alice_pataxo ApibOficial teiadospovos

Fonte: Twitter | Elaboração: DAPP/FGV

Em uma análise sobre os dez principais atores do debate sobre indígenas no Twitter por ano, observa-se a presença predominante de perfis de indígenas, instituições indigenistas e instituições indígenas. Destaca-se, também, o aumento do protagonismo de mulheres indígenas, que ocuparam quatro posições em 2019, seis em 2020, e sete até maio de 2021. Os atores com maior alcance potencial são calculados com base em uma estimativa de pessoas que viram uma determinada postagem de uma fonte. O cálculo analisa o alcance das menções da fonte dentro do período determinado. O alcance em si é calculado usando métricas como seguidores, engajamento, classificação de páginas e visualizações estimadas.

Nota-se, também, uma maior presença de perfis de organizações e coletivos no ano de 2019, como @xinguvivo, @apiboficial, @MNIndígena, @Indio_eh_nos, @RadioYande e @midia_india, em comparação com os anos posteriores, quando perfis pessoais passaram a obter maior destaque.

Variação de posição entre atores com maior alcance potencial no debate sobre povos indígenas no Twitter

Período: 1º de março de 2019 a 31 de maio de 2021

Fonte: Twitter | Elaboração: DAPP/FGV

O gráfico acima mostra a variação de posições ocupadas pelos atores com maior alcance médio no debate sobre indígenas nos anos 2019, 2020 e 2021. É possível dividir em dois grupos principais: 1) os que estiveram entre os principais atores em mais de um ano; e 2) os que figuraram em apenas um dos anos analisados. No primeiro grupo, o grande destaque é a influenciadora @alice_pataxo, que figurou nos três momentos analisados, obtendo crescimento expressivo e alcançando o posto de principal perfil do debate entre janeiro e maio de 2021. As ativistas @GuajajaraSonia, @JoeniaWapichana e @ApibOficial apresentaram movimento semelhante, com queda em 2020 e crescimento nos primeiros cinco meses de 2021. Por fim, os perfis @AvelinBuniaca e @DMunduruku figuraram entre os perfis com maior alcance potencial em 2020 e repetiram o desempenho em 2021.

Já o segundo conjunto é formado por perfis que figuraram em apenas um dos anos monitorados. Conforme apontado anteriormente, esse processo é bem demarcado no caso de organizações e coletivos, que ocuparam posições de destaque especialmente em 2019. Outro conjunto interessante se refere aos perfis que figuraram entre os com maior alcance potencial em 2021, com destaque para a presença de mulheres indígenas de diferentes gerações como @oncapataxo, @PataxoThyara e @elianepotiguara.

Ao longo do período, diferentes episódios renderam protagonismo a diferentes categorias de perfis. Perfis indígenas tiveram destaque, principalmente, quando da onda de incêndios que assolou o Pantanal em setembro de 2020. Na ocasião, tiveram forte engajamento, alertas e denúncias feitas pela comunicadora e ativista @alice_pataxo. Outros atores cuja preocupação com as queimadas chamaram a atenção da rede foram @xunakalo e @PataxoThyara.

Outros momentos relevantes protagonizados por indígenas foram as celebrações do Dia dos Povos indígenas, em abril de 2021, com perfis como @alice_pataxo, @oncapataxo e @kaeguajajara compartilhando detalhes da história da instituição da data, bem como experiências e percepções sobre identidades indígenas; e alertas sobre a intensificação dos problemas enfrentados pelas comunidades, em junho de 2020, tais como assassinatos, incêndios e o avanço da Covid-19 sobre as aldeias. Nesse contexto, destacam-se os perfis de @ChirleyPankara, @Dario_Kopenawa e @KaroMundukuru.

Sobre a participação de instituições indígenas no debate, dois momentos merecem atenção. Em setembro de 2020, acusações feitas pelo chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, general Augusto Heleno, de que a @ApibOficial estaria coordenada com ativistas e instituições estrangeiras para atacar o governo federal e prejudicar a imagem do Brasil aqueceram o debate em torno da entidade. A Articulação dos Povos Indígenas voltou a ser alvo de ataques em abril de 2021, com a notícia de que o discurso de Jair Bolsonaro (PL) na Cúpula do Clima teria sido bem avaliado por alguns países; o que foi avaliado, na ocasião, como uma resposta à entidade, bem como a outros atores e instituições ambientalistas críticos ao governo federal.

No debate sobre instituições ambientalistas, o ISA obteve uma menção com grande repercussão em um tuíte do perfil Quebrando o Tabu, com dados que apontam a possibilidade de uma denúncia na ONU contra o governo brasileiro pelo risco de genocídio de povos indígenas por conta do desmatamento. O Cimi, no debate sobre indígenas, serve como fonte de um tuíte de grande alcance feito pela indígena Karibuxi, influenciadora indígena com mais de 50 mil seguidores e em grande ascensão na plataforma.

Por fim, perfis internacionais estiveram no centro do debate em novembro de 2019. Declarações de Jair Bolsonaro ‒ em que alega suspeitas de que o ator e ambientalista norte-americano @LeoDiCaprio, juntamente com outras ONGs, seria responsável pelos incêndios que atingiram a Amazônia naquele período ‒ renderam uma onda de postagens irônicas. Apesar do grande volume de memes, houve quem reiterasse as suspeitas do presidente, com informações de supostas doações, feitas pelo ator, a organizações internacionais ligadas às queimadas.

Evolução de menções a campanhas sobre indígenas e populações tradicionais no Twitter

Período: 1º de março de 2019 a 31 de maio de 2021

Fonte: Twitter | Elaboração: DAPP/FGV

As campanhas que dizem respeito à promoção das pautas dos povos tradicionais apresentaram quatro momentos de menções mais expressivas e, de maneira geral, estiveram fortemente associadas a ações lideradas por entidades indígenas contra o governo federal. O primeiro pico, em julho de 2019, corresponde aos compartilhamentos referentes à Primeira Marcha das Mulheres Indígenas, em Brasília, organizada pela Apib com o tema “Território, nosso corpo, nosso espírito”.  Em junho de 2020, um incêndio na Terra Indígena Guarani, no Jaraguá, Zona Norte de São Paulo, sensibilizou diversos perfis que exigiram ações de combate e suporte aos atingidos, mobilizando as campanhas #vidasindigenasimportam, #DescasoÉCrime, #Incendiojaragua, #jaraguaeguarani.

Setembro de 2020 constituiu o pico mais acentuado e foi marcado pelas campanhas #AmazonOrBolsonaro e #DefundBolsonaro, ampliando a atuação de grupos inclusive para além das fronteiras nacionais. Por fim, abril de 2021, mês da Resistência Indígena e no qual se comemora o Dia da Terra, deu continuidade às investidas contra o governo Bolsonaro, obtendo adesão de perfis relevantes em desempenho digital e diferentes frentes de ação – de tuitaço (#AmazoniaOuBolsonaro, #AmazonOrBolsonaro) à circulação de vídeos endereçados ao presidente Joe Biden contra acordo sobre a Amazônia com o presidente Jair Bolsonaro.

Outra campanha de grande repercussão ocorreu em torno da hashtag #ForaGarimpoForaCovid, contando com um alcance potencial de 2,5 milhões de usuários. No monitoramento, foram identificados 2.443 retuítes em tuítes sobre a campanha. O alto alcance potencial esteve relacionado aos perfis com grande número de seguidores que se engajaram na campanha, como a cantora e ex-BBB Karol Conká. 

Evolução de menções a eventos-marco sobre indígenas e populações tradicionais no Twitter

Período: 1º de março de 2019 a 31 de maio de 2021

Fonte: Twitter | Elaboração: DAPP/FGV

Os números recordes de desmatamento na Amazônia Legal, com ênfase no período de agosto de 2019, desencadearam uma disputa de campos políticos distintos a respeito dos dados e de sua “validade”, com vantagem para atuação de perfis aliados ao governo federal. Aqui o discurso mobilizado reforça o argumento de soberania nacional sobre a Amazônia em oposição a líderes “oportunistas”, as campanhas #AAmazoniaENossa, #AmazoniaSemONG são notabilizadas nesse segmento do debate. Em setembro de 2020, os incêndios no Pantanal organizam a ação de grupos opositores ao governo, que além de repercutirem os danos a flora, fauna e comunidades tradicionais locais, também se ocuparam de campanhas de arrecadação para prestar socorro aos atingidos. As campanhas #AjudaPantanal e #PantanalEmChamas ampliaram o alcance dessas ações.

Estudo de caso: o inquérito contra Sônia Guajajara

Entre 26 de abril e 8 de maio de 2021, foram identificadas 42,2 mil postagens no Twitter referentes ao pedido da Fundação Nacional do Índio (Funai) pela abertura de inquérito contra Sônia Guajajara por lesa-pátria. O momento de maior mobilização no debate aconteceu em 1º de maio, um dia após a ativista anunciar, por meio da sua conta na plataforma, a intimação da Polícia Federal para depor no inquérito. O tema voltou a repercutir no dia 6, com a notícia de arquivamento do pedido de inquérito.

Evolução do debate sobre o inquérito de Sônia Guajajara

Período: 26 de abril a 08 de maio de 2021

Fonte: Twitter | Elaboração: DAPP/FGV

Mapa de interações do debate sobre o inquérito de Sônia Guajajara

Período: 26 de abril a 08 de maio de 2021

Fonte: Twitter | Elaboração: DAPP/FGV

Laranja ‒ 38,2% dos perfis | 40,4% das interações

Orbitando o tuíte de Sônia Guajajara sobre a intimação da PF, grupo composto por órgãos ambientalistas, indígenas e ativistas sociais e ambientais manifesta indignação com a decisão da Funai ‒ ao mesmo tempo em que presta solidariedade e apoio à ativista. Classificando a ação como arbitrária, postagens insinuam o aparelhamento de instituições públicas para intimidar o movimento indígena.

Vermelho ‒ 31,4% dos perfis | 34,0% das interações

Agitado por políticos de esquerda, colunistas e blogueiros de oposição ao governo, grupo ‒ que conta com a participação de indígenas ‒ reitera, a partir do episódio envolvendo Sônia Guajajara, a alegação de que o governo estaria usando a Polícia Federal, sobretudo, para perseguir órgãos e pessoas críticas à sua gestão. 

Rosa ‒ 9,7% dos perfis | 9,1% das interações

Com influenciadores digitais, ativistas sociais e indígenas e políticos de esquerda, grupo mais heterogêneo traz detalhes sobre o andamento do caso. Comentando o envolvimento da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) na intimação, os perfis comemoram o arquivamento, pela Justiça Federal do DF, do inquérito contra o órgão e Sônia Guajajara. 

Lilás ‒ 6,0% dos perfis | 4,8% das interações

Mobilizado por canais de mídia alternativa e blogueiros e influenciadores conservadores, grupo condena os ataques de Sônia Guajajara contra o governo federal e interpreta a intimação pela Polícia Federal como uma forma de se cobrar as devidas satisfações da ativista sobre seus posicionamentos.

Verde ‒ 5,8% dos perfis | 4,9% das interações

Composto por professores, estudantes, sociólogos e políticos do PSOL, esse grupo repudia a intimação sofrida por Sônia Guajajara e denomina de “perseguição política” a atitude da Polícia Federal. As postagens salientam, em tom de denúncia, que essa intimação retrata trações de regimes autoritários, os quais vêm se intensificando no governo Bolsonaro.

Amarelo ‒ 4,6% dos perfis | 4,8% das interações

Movimentado por ativistas, cientistas políticos e canais de comunicação, esse grupo repercute – além da líder indígena Sônia Guajajara – atores políticos e figuras públicas que foram intimados pela Polícia Federal por criticar o governo federal. O debate é conduzido por postagens que apoiam e defendem a líder indígena, como também entoam enunciados que designam o presidente brasileiro de “genocida” e “antidemocrático”.

Principais atores por grupo no debate sobre o inquérito de Sônia Guajajara no Twitter

Período: 26 de abril a 08 de maio de 2021

Amarelo Laranja Lilás Rosa Verde
Perfil Perfil Perfil Perfil Perfil
g1 GuajajaraSonia revistaoeste felipeneto safbf
quebrandootabu Thiamparo sigagazetabr andretrig edmilsonpsol
fiscaldoibama Apiboficial simonescbrasil tatinefertari andreiathomaz3
marciatiburi socioambiental brazilfight proindio matheuspggomes
emirsader walela15 renovamidia samiabomfim marklizepsol

Fonte: Twitter | Elaboração: DAPP/FGV

Uma análise dos atores com maior centralidade em cada grupo do debate sobre o inquérito contra Sônia Guajajara é um exercício que ajuda a compreender de modo amplo a coalizão de atores e perfis que usualmente se engajam no debate sobre indígenas e populações tradicionais nas plataformas de mídias sociais. 

Os grupos podem ser apresentados em quatro principais conjuntos. Os grupos Amarelo e Rosa foram formados por organizações e lideranças sociais com vínculo ou cobertura frequente com o debate indígena e espaço de visibilidade em veículos de mídia de massa, como o próprio perfil do site @g1; os acadêmicos @marciatiburi e @emirsader; a organização @quebrandootabu; os influenciadores @felipeneto e @tatinefertari; e o jornalista @andretrig. Com forte ligação com o debate ambiental e indígena, constam também os perfis @fiscaldoibama e @proindio.

O perfil Laranja também reúne perfis com forte ligação com o debate indígena, como @GuajajaraSonia e @walela15 e as organizações @ApibOficial e @socioambiental. O acadêmico @thiamparo foi o ator de destaque com perfil mais heterogêneo desse conjunto.

O último conjunto da coalizão em defesa de Sônia Guajajara foi formado por lideranças políticas ligadas a partidos e causas de esquerda, com destaque para o PSOL e o Ecossocialismo. Em cor Verde, esse grupo teve como destaque a presença da ativista e youtuber @safbf e do político @edmilsonpsol. 

Por fim, no conjunto que se posicionou favoravelmente à intimação de Sônia Guajajara, há a presença de influenciadores contumazes no debate conservador, com destaque para veículos alternativos de mídia como @revistaoeste, @sigagazetabr e @renovamidia, além de coletivos e ativistas como @brazilfight e @Simonescbrasil.

Ao longo dos últimos dez anos, o debate sobre indígenas e populações tradicionais ganhou força e espaço cada vez maiores, tanto na mídia tradicional quanto nos sites de redes sociais e plataformas de mídias digitais. Acontecimentos da conjuntura política – como as Jornadas de Junho de 2013 até a emergência de lideranças conservadoras ao poder e ao centro do debate público – foram determinantes para cada tema mapeado neste estudo e para a própria evolução e maneira de se comunicar e de se consumir conteúdo. De lá para cá os ambientes online foram se legitimando como um espaço de convivência para nichos, mas não só, e hoje também se constituem como um local marcado pelas disputas de narrativas.

A imprensa apareceu ao longo de todo o levantamento, sendo um dos principais meios para a promoção e aumento da repercussão de pautas ligadas a indígenas e populações tradicionais. As celebridades tiveram repercussão importante no Instagram, em que figuraram, em todos os debates, como principais influenciadores. Interessante notar que essa atuação não se reflete em outras redes, em que organizações ligadas às causas se mostram mais proeminentes.

Ainda que o pano de fundo da política nacional, e a visibilidade que determinados atores e enfoques tomam no debate público, possa numa primeira análise ser pernicioso para as causas ambientais e indígenas, é importante salientar que, no recorte do estudo, a mobilização foi predominantemente assumida por perfis comprometidos e engajados com os temas, e com alinhamento ideológico marcadamente à esquerda.

Adicionalmente, é interessante destacar o protagonismo crescente das organizações indígenas e indigenistas, além de representantes e lideranças indígenas. Nesse ponto é inconteste a atuação distinta de mulheres ativistas indígenas, relevantes tanto na arena institucional quanto nos ambientes digitais, a exemplo de Sônia Guajajara, Joênia Wapichana e Célia Xakriabá.

A emergência de influenciadores digitais indígenas se nota crescente com o passar dos anos, sobretudo no Instagram. A plataforma comumente angaria amplo engajamento por meio de campanhas de mobilização e agrega públicos nem sempre comprometidos com a causa, mas que gera visibilidade expressiva com a aderência de celebridades e figuras do meio artístico.

Mídias e influenciadores indígenas